" A informação se transmite, o conhecimento é adquirido através de informações."concatenado por Brenda

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Por que não conversar?






Quando esse blog nasceu, e eu infelizmente não estava presente, a ideia exposta foi de discutirmos assuntos tratados em sala de aula. No entanto, com o andar da carruagem, alguns comentários infelizes foram nascendo. Lamento. Normalmente a iniciativa cultural leva a esse tipo de coisa. Porém, não foi esse o intuito deste post. Ele apenas abre uma discussão muito maior.
Sou professora, puramente por amor. Lecionei espanhol para los niños por anos. Entrei no curso de letras para lecionar literatura portuguesa, cai em inglês por acaso. Mas ainda não é esse o foco do post. Quero apenas fazer pensar em assuntos diversos... somo-os ao contexto ao final.

Durante a aula de filosofia, com o professor Wallene, foi-nos apresentada uma proposta. Após assistirmos "Preciosa, uma história de esperança", nos foi lançada a ideia de associarmos o filme a nossa realidade educacional, tratando o assunto familiar como algo que interfere na sala de aula.

Como a família influi no desenvolvimento escolar do aluno?
Como a sociedade fecha os olhos para isso?
Como nós, professores, acabamos varrendo a sujeira para debaixo do tapete e fazemos prosseguir a segregação dentro da escola e, por fim, dentro da sociedade?

Tive uma experiência não muito fácil com sala de aula. Nessa época eu estava do lado de cá da força, do lado que não tinha sabre de luz ou qualquer coisa do gênero. Eu era aluna naqueles tempos.
Tive um colega com uma história de família muito dolorosa. Uma história não muito diferente de Preciouss. E era comum vê-lo sair da escola para socorrer a mãe que sofria maus tratos constantes de seu pai.
Tínhamos 15 ou 16 anos naquela época. Não era difícil percebê-lo em crise, mas era mais fácil omitir-se a isso. No entanto, estávamos todos no mesmo barco.
Do lado de lá, com a fama de durão, um professor reprovou esse aluno, por 0,01. Sim. Ele foi capaz de prejudicar toda a vida escolar de um aluno, com sérios problemas familiares, por 0,01 em química. Era o nosso último ano no Ensino Médio. Ele foi aprovado em todas as outras disciplinas. Porém, reprovado por conta desta.
O silêncio reinou sobre esse caso. O professor era supremo. 

Cadê a dignidade desse jovem?
Que será que foi feito dele? Foi entupir mais cárceres?
Onde mora a autoestima, os sonhos, os planos?
Onde estava a educação, a inclusão, os direitos humanos?

Não acredito na reprovação e não a defendo. Toda criança e todo jovem precisa ser visto como ser humano capaz de realizar grandes coisas, mas como ser humano capaz de sofrer grandes dores. Por que não conversar?

A família não é sempre o núcleo sagrado. Esses dias eu lia Tolstói e me deparei com uma passagem incrível "As famílias felizes são todas iguais. As infelizes são infelizes cada uma a sua maneira''. Apesar da generalização, o que ele diz tem muito sentido. Cada família tem seu problema. Não estou aqui para apontar soluções para esses problemas, mas para cutucar a situação atual e acomodada dentro da escola. Acertar, conhecer, se deixar conhecer é complicado, mas é possível.

No começo do ano letivo tive que ouvir de uma colega que "a pior coisa de uma escola é precisar aprovar um aluno sem capacidade". Isso me fez respirar fundo uma, duas, três vezes e responder que não se trata disso. Dói perceber que a colega não entendeu ainda o espírito da educação. Infelizmente ela não é um caso isolado.

Nas escolas formais, os alunos são reprovados por avaliações em provas escritas, que nada mais atestam que a incapacidade do professor. Ora, o dia a dia da criança não conta? As pequenas descobertas não servem? As perguntas inteligentes, a interação, a eficiência nos trabalhos em equipe. Estes momentos não representam?

Fizemos provas bimestrais para atestar que sabíamos falar? Para afirmar que sabíamos andar? Não. Precisamos fazer então para atestar que pensamos?

Não acredito, só para deixar claro, que a escola tenha o direito de interferir na vida familiar. No entanto, acho que é preciso observar. É preciso ir além, é preciso questionar. É preciso refazer o caminho e riscar os erros. A escola não está aí para cortar os brotos. Para impedir que nasçam os novos frutos. A escola é o refúgio e o ponto de partida. É na escola que eles pousam e decolam. É preciso abrir a mente, abrir as portas, porém, enquanto aqui estiverem, é preciso cuidar do ninho e tratar de ensinar-lhes para que servem suas asas. Assegurar o nosso respeito para com eles e assegurar o respeito deles para com eles mesmos e conosco.

Por que eu falei do blog lá em cima? Porque eu acredito que as pessoas estão mais preparadas para criticar que para ajudar. Não é simples estender a mão para ajudar o colega? Qual é a então a possibilidade existente de se esticar a boa vontade para ajudar um aluno? Educação não se faz com homens e livros e isso eu posso repetir sem medo de estar sendo totalmente radical. Educação se faz com ouvidos, coração, consciência e um pouco de intuição. Compaixão... não. Compaixão não é a palavra. Aliás, acho que a piedade nunca foi boa. Porém, se ela servir ao menos de estopim, caro colega professor, use-a. Mas use-a de modo a ajudá-lo a ver dentro de si e dentro do outro. É preciso olhar pra dentro do aluno e compreender que todas as dúvidas moram naquele poço, para sacar lá de dentro as certezas que ele mesmo não conhece e dizer-lhe "Vês? Esses são teus instrumentos de vida. Usa-os". A autoconfiança muda tudo, a educação lhe diz pra onde ir. Livros são o que vem pra acrescentar. Primeiro é preciso tornar o professor mais que um homem, é preciso torná-lo uma criança, capaz de se encantar, de se assombrar, de dar a mão. Depois é possível dar-lhe um livro e dizer, "vai, ensina."

Por que eu lhes disse sobre minha vida na educação? Porque ainda não me achei e ando experimentando os seus núcleos. Mas também pra lhes mostrar que na educação também estamos aprendendo. E mudando.

Ainda espero pelo professor que traga nos olhos a capacidade, que segundo os gregos, era o início do pensamento: A capacidade de se encantar.
(parafraseando Rubem Alves)


Até a próxima.


Melzinha.


(Dúvidas, sugestões, reclamações, tudo-tudo para mel_uepb@hotmail.com)



2 comentários:

  1. Ao terminar de ler esse post respirei fundo e fiquei sem ação como poucas vezes fico ao ler qualquer coisa, poucos conseguiram o que vc conseguiu com suas palavras não sei se por está emotiva estes dias ou por vc saber escrever muito bem... mas sabe de uma coisa MEL vc não é só doce no nome é em atos, palavras e omissões, te conheço pouquissímo porém tenho o maior respeito e orgulho de te ter como colega e de ler as coisas maravilhosas que vc sabe escrever tão bem...hj mas do que nunca tenho maior orgulho de ter te metido nessa confusão adorável que é esse Blog.

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  2. Faço minhas as palavras de Yonarah!
    Muito bom, Mel.

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